Lembranças da meia
noite.
E o doce não era
salgado.
Voltava de minha
jornada de muitos quilômetros. Foram oito dias no lombo de uma bicicleta. Pela
primeira vez estava cansado. Muito. Aconteceram tantas coisas que deixei para
anotar outro dia. Passamos pela sede para deixar as tralhas e alguns materiais
de sapa devidamente limpos e oleados. Éramos seis. Todos da Patrulha Raposa.
Cada um montou na sua bicicleta, disse um sempre alerta calmo e partiram para
suas casas. Da sede em minha casa não gastaria mais do que quinze minutos. Ao
passar pela padaria Bom Pastor vi que o pneu da frente estava furado.
Paciência. Isto para nós aventureiros ciclísticos era rotina. Manezinho e sua
bicicletaria ficava menos de dois quarteirões.
- Osvaldo sua conta
aqui está alta. Mais de oitenta reais (em dinheiro de hoje). Vai me desculpar,
mas enquanto não me pagar não faço mais nenhum serviço para você. - Eu sabia
disto. Nunca aconteceu. Ganhava uns trocados com minha caixa de engraxate. Não
tinha mesada. Quem dera. Não discuti com Manezinho. Ele tinha razão. Triste fui
empurrando minha bicicleta a pé. Reclamei da sorte. Todos meus amigos da
patrulha tinham pais que davam alguns trocados. O meu não podia. Era seleiro.
Ganhava pouco. Gastei quase vinte e cinco minutos até próximo a minha casa.
Agora era deixar a bicicleta guardada e tentar ver o que podia fazer para pagar
o Manezinho. Nossa oficina portátil da patrulha não tinha nada para me ajudar.
Um quarteirão da minha
casa. Ouvi o Rataplã. Que foi? Nosso hino cantado na rua? Quem? No portão de
madeira da minha casa, minha mãe, meu pai e minhas duas irmãs rindo e batendo
palpas. O Rataplã terminou e a Arvore da Montanha surgiu esplendidamente. Minha
família me abraçou - Meu pai me deu as boas novas – Sua tia da capital mandou
um presente. Um LP escoteiro do disco do Trio Irakitan. Todo ele só músicas
escoteiras. Chorei de alegria. Nunca soube do disco. Na bicicleta de meu pai
voei até as casas dos patrulheiros dando as boas novas. À noite ainda criança,
ouvíamos as canções lindas cantadas na vitrola da família. Sentados no quintal
mais de trinta escoteiros e seniores. Lá pelas duas da manhã meu pai mandou
todos embora. Hora de dormir disse e completou que o disco podia furar! Risos.
Considerei-me um
“sortudo”. A tristeza acabou. Sabia que iria pagar o Manezinho em breve. Até lá
ia rezar e agradecer minha tia por aquele presente que nunca ninguém do Grupo
Escoteiro tinha ganhado. A vida é assim, atrás das tempestades vem a bonanza.
Aprendi muito e hoje lembro que as dificuldades não passaram de momentos bons e
ruins e que ficaram no tempo. Seguir o meu destino foi o que sempre fiz.
Boa noite meus amigos e
minhas amigas.
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