Uma deliciosa conversa ao pé do fogo!

Amo as estrela, pois mesmo tão distantes nunca perdem seu brilho, espero um dia me juntar a elas, e estar presente a cada anoitecer alegrando o olhar daqueles que amo

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

A Jarreteira de Daniel San.


Conversa ao pé do fogo.
A Jarreteira de Daniel San.

                           Todos estavam perplexos com as fitas verdes e amarelas penduradas no meião de Daniel San. Ele todo posudo chegou à sede se exibindo. Foi para o canto de patrulha e o Monitor perguntou a ele o que era aquilo – Uma jarreteira Monitor, nunca ouviu falar? – Joel nem sabia o que era. Para não demonstrar ignorância não disse mais nada. Ele sabia que peças que não eram do uniforme não era permitido usar. – Falou com o Chefe? Ele perguntou. – Ainda não, mas ele vai ficar admirado da minha jarreteira. – E quem lhe disse que são peças Escoteiras? – Minha Avó disse que meu Avô foi Escoteiro em Portugal e usava. – Seu Avô? Ele era português? – Claro, meu Avô foi um Escoteiro e chefão em Funchal na Ilha da Madeira. Fez todas as provas e chegou a Liz de Prata. Olhe quando cresceu foi Escoteiro Chefe. Minha Avó sempre me conta como sua casa vivia cheia de Escoteiros! – Joel ouviu o apito do Chefe. Ele chamava os monitores. Passou o comando para Francis o Sub Monitor e saiu correndo. A patrulha ficou em silencio olhando a Jarreteira de Daniel San.

              - Estou vendo que o Daniel San colocou uma Jarreteira, - Perguntou o Chefe Jaguar. – É Chefe, ele chegou assim e disse que em Portugal todos os Escoteiros usam – Tudo bem, não diga nada a ele. Vou aproveitar para fazer uma palestra sobre as Jarreteiras. Assim todos aprendem e claro, irão saber que aqui no Brasil não usamos mais. – Joel ficou pensativo, ouviu o Chefe quanto à próxima atividade que fariam naquele dia, um jogo fora da sede e que todos deveriam ficar alertas para não acontecer nenhum acidente. O jogo foi legal. Deveriam descobrir um homem chamado Maneta que ninguém conhecia. Ele estava vestido comumente, sem nada especial, mas alguma coisa chamaria a atenção quando o vissem. Ao descobrir deveriam formar a patrulha em linha a sua frente e cantar o Rataplã. Se ele sorrisse e dissesse sempre alerta, era o procurado se não iriam dar com os burros nágua. As patrulhas se divertiram a beça em volta da sede. Muitas erraram feio, mas o Chefe instruiu a todos que a cortesia e a apresentação iria mostrar que o erro faz parte e o apresentado iria compreender bem.

                 - A Patrulha Castor ganhou o jogo. Eles viram o homem na esquina da Marechal Deodoro e foi Tonico quem reparou que seu cadarço tinha duas cores. O Chefe deu um tempo livre de dez minutos e formou todos em ferradura – Alguém já ouviu ou viu uma Jarreteira? – Todos nem sabiam o que era isto. – Reparem em Daniel San. Ele hoje veio com uma. Ela não é mais usada no Brasil e poucos países do mundo a usam. Portugal mantem a tradição. – Tradição Chefe? – Disse Bartolo Monitor da Castor. – Isto mesmo, ouve uma época que nós usamos, mas depois foi extinto o uso. Baden-Powell usou sempre em seu uniforme. Mas olhem, é melhor eu contar para vocês a história – Querem ouvir? – Todos olharam o meião de Daniel San e sorrindo disseram sim! Tudo bem, vamos lá, a Jarreteira é uma fita que serve para prender o meião à perna, desenhada com as cores dos ramos para membros juvenis e de acordo com as funções exercidas para os chefes do movimento Escoteiro. Existiu ou ainda existe uma Ordem Militar de Cavalaria, instituída por Eduardo II, rei da Inglaterra denominada Ordem da Jarreteira. É a mais nobre das oito ordens que possui o Império Britânico.

                  - Continuou o Chefe Jaguar – Ninguém sabe de concreto sobre a data da sua instituição. Vem do século XIV. Quanto ao ano a opinião dos historiadores heráldicos varia desde 1340 até 1351. Inicialmente ela só era usada pelo soberano e 25 cavaleiros. Até 1786 não sofreu nenhuma modificação. Só em 1805 se fez a segunda modificação. Finalmente em 1831 ordenou-se que o privilegio seria concedido aos descendentes diretos de Jorge II e Jorge I. Na época não se permitia mulheres na ordem. Existe uma lenda, segundo a qual por ocasião de um baile, caiu à liga da Condensa de Salisbury, dama da corte de Eduardo III e o rei abaixou-se rapidamente para apanhar e entregar à dama. Isto deu motivo de riso e graças por parte dos presentes e o rei exclamou: “Honny soit qui mal y pense”. (mal haja quem nisto põe malicia). Ouve outras lendas como aquela de Ricardo I que ao atacar Chipre invocou São Jorge que lhe deu grande ânimo e veio à ideia de atar as pernas dos cavaleiros com uma fita de couro que lhes lembrassem o feito. Eduardo II ao instituir a Ordem da Jarreteira designou a liga como seu emblema. O distintivo desta ordem é, com efeito, uma liga que, bordada a ouro e pedrarias (jarreteira) tem a legenda: - Honny soitqui mal y pense. Atada na perna esquerda junto ao joelho.

                A tropa pela primeira vez prestava a máxima atenção. Daniel San se sentia um cavaleiro britânico com suas jarreteiras. Continuou o Chefe Jaguar: - Os cavaleiros do rei usam no lado esquerdo do peito uma placa de prata ou estrela de oito pontas representando a Cruz de São Jorge. Usam também um colar de ouro, composto de 26 peças em forma de jarreteiras, esmaltadas de azul com a imagem de São Jorge abatendo o dragão. Finalmente usam uma cinta de azul escuro, atravessada sobre o ombro direito e debaixo da qual há uma joia de ouro em forma de jarreteira, rodeando a imagem de São Jorge com a divisa da Ordem. Assim esta insígnia foi concedida ao Escotismo, motivo de muitos Escoteiros ainda usarem um pedaço de tecido pendurado na parte exterior das meias do uniforme e presa pela liga. As histórias da Ordem da Jarreteira se confunde em muitas lendas que até hoje são lembradas e usadas por grandes personalidade britânicas. Lembro que em Portugal todos os Escoteiros usam as jarreteiras.

                 Chefe Jaguar se calou e olhou para Daniel San. – Obrigado Daniel San por trazer uma jarreteira onde todos pudessem conhecer sua história. Infelizmente aqui no Brasil elas não são mais usadas e assim você deu um belo exemplo em mostrar que existem histórias, lendas e tradições que marcaram muito o movimento Escoteiro por muitos anos e vai ser lembrado por toda a vida. Guarde bem sua jarreteira no seu baú do tempo para quando crescer lembrar dela com saudades! – Daniel San viu no Chefe Jaguar um cavaleiro Britânico no tempo de Eduardo II e sendo saudado por todos que pertenciam ainda a Ordem das Jarreteiras. Daniel San nunca mais usou em reuniões, mas sempre ao chegar em casa com seu uniforme, colocava sua jarreteira e ficava olhando e lembrando de um passado que hoje não existe mais!      





domingo, 22 de fevereiro de 2015

Minha, nossa, tua admirável Vovó Guiomar.


Conversa ao pé do fogo.
Minha, nossa, tua admirável Vovó Guiomar.

                   Ela não foi e nem era minha avó consanguínea. De nenhum dos Escoteiros. Assim como eu todos nós a chamávamos de Vovó e tínhamos por ela um amor todo especial. Acho que foi a Vovó com mais netos no mundo. Idade? Ela dizia ter 92 anos quando cheguei ao Grupo. Nunca esqueci aqueles sábados deliciosos que ela estava conosco sorrindo, cantando, brincando e tentando ser séria no cerimonial de bandeira, mas com um sorriso brejeiro. Disseram-me um dia que no passado ela acampava ia aos acantonamentos, viajava com a tropa e me garantiram que quando pediram a sede no Grupo Escolar Pedro de Matos ela foi sozinha no palácio do Governador para pedir que cancelassem a ordem. Não quiseram deixá-la entrar e ela ficou ali na porta sentada no meio fio por um dia inteiro. Teve insolação e depois de medicada quiseram levá-la para casa. – Não sem antes falar com o Governador ela disse. – Um assessor se prontificou e ela agradeceu, mas o assunto era com o governador. – Mocinho, eu votei nele e ele não pode me receber? – Doutor Morato o Governador assustou quando soube e deu belas risadas. Foi lá na antessala e deu nela um forte abraço. Claro aproveitou para fotos, pois a eleição estava próxima. A ordem foi cancelada e ganharam mais uma sala. A diretora que agiu assim foi demitida. Vovó Guiomar não gostou e de novo voltou ao Governador. Agora entrava direito. A demissão foi revogada.

                               Interessante que ela se tornou um de nós e a gente nem prestava mais atenção nela. Mas quando faltava era aquela preocupação e lá íamos nós após as reuniões em grupos a casa dela preocupados. Sei que morava só. Sei também que sempre foi solteira e no passado distante namorou um Chefe de nome Castor. Um dia foi achado boiando no rio Santissimo. Ninguém soube por que morreu. Vovó Guiomar não chorou. Ficou dias pranteando seu amado no Cemitério das Flores. Meses depois voltava lá uma vez por mês fato que até hoje/ontem se repete. Se aquele que amei não foi meu eu não serei de mais ninguém. Ela ria e dizia – Eu casei com o Escotismo. Baden-Powell foi meu padrinho! Era uma pândega e a gente nunca a viu chorar. Se um Chefe faltasse lá estava ela para substituir. Nunca fez nenhum curso e todos sentavam em sua volta e ela fazia um campeonato de piadas. Gostosas piadas. Ela era mestre e sabia contar cada uma que coravam a gente, mas a risada vinha naturalmente sem malícia.

                        Faltou barraca? Faltou facão? Faltaram talheres? Faltou material para os lobos? – Quero a lista ela dizia. No dia seguinte o comércio local tinha de aguentar seus pedidos.  Não perdoava nem mesmo os supermercados com a lista de mantimentos para os acampamentos. Nunca aceitava sair de mão abanando. Ela resolvia tudo. Um dia um Chefe novato resolveu fazer uma diretoria. Não a consultou. Os novos diretores assumiram e nem ligaram mais para ela. Ficava no pátio se sentindo rejeitada. O dinheiro do grupo escasseou. Não tinha mais para comprar materiais. Ela não mais sorria. Sempre com uma cadeira que pegava na sede e na sombra da aroeira sentava como se estivesse cochilando. No conselho de chefes falaram sobre ela. Ela não merecia o que estava acontecendo. – Se não fosse ela não seriamos o que somos hoje – Disse a Akelá Naninha. Reverteram tudo. Disseram a ela que seria a Presidenta. Mandava agora na diretoria. Muitos não quiseram e pediram demissão. O grupo voltou ao normal.

                            Uma tarde alguém veio avisar que ela tremia. De olhos abertos sorria e tremia. Ninguém sabia o que era. Não reconhecia ninguém. O Chefe Damásio levou-a ao pronto socorro. Ainda sem exames completos diagnosticaram como Mal de Alzheimer. Sua memória começou a falhar, ficava desorientada para voltar para casa, mesmo indo ao grupo se sentia desinteressada, e em alguns momentos ficava agressiva e desagradável. O Hospital marcou o dia para levá-la a uma casa de repouso especializada. Ela foi a contragosto. Todos os domingos a escoteirada corriam todos para lá. Ela aos sábados fugia e pedindo carona chegava ao Grupo Escoteiro sorrindo. Suas crises iam e vinham. Os enfermeiros já sabiam onde ela estava e ninguém deixava que a levassem enquanto não acabasse a reunião. Tentaram fazer um pedido de uma medalha de Gratidão Ouro e recusaram. 120 Escoteiros foram pessoalmente na Assembleia Regional e entraram no auditório pedindo a palavra. Aprovaram a medalha. Foi entregue em um sábado de sol, ela em uma cadeira de rodas com dois enfermeiros no cerimonial de bandeira. Havia neste dia mais de quinhentas pessoas presentes. Antigos Escoteiros do grupo acorreram de todas as partes. A palma escoteira dizem que em tempo algum será a mesma.


                         Morreu quatro anos depois. Estava irreconhecivel. Nas suas exéquias milhares de antigos Escoteiros presentes. Lorentino morava no Japão e quase não chegou a tempo. Zeca e Bambocha estavam no Suriname e alugaram um jatinho. Centenas de milhares de pessoas emocionadas e lágrimas caiam sobre a terra do campo santo. Zé Arrebol levou seu clarim e tocou o mais lindo toque do silêncio de todos os tempos. A canção da despedida com milhares cantando foi em determinados momentos silenciosa. Seres humanos engasgados choravam e cantavam baixinho. Contaram-me que todas as tardes milhares de borboletas invadiam o seu tumulo por muitos anos. O enterro foi às cinco da tarde, mas às onze da noite guardas de patrulhas escoteiras lá estavam prestando sua homenagem. Rio Pequeno nunca mais foi o mesmo. Mudaram o nome do grupo para Vovó Guiomar. Nos encontros, jamborees e Camporee e outras atividades riam quando se falava o nome do grupo. Mas eles não sabiam que no coração de cada um Vovó Guiomar fez sua morada. E sabiam quem ali era iria morar para sempre. 

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Quebra Coco. O último desafio!


Conversa ao pé do fogo.
Quebra Coco. O último desafio!

                 Ainda bem que o tempo não apagou estas lembranças incríveis. Não sei se hoje cantam nos fogos do conselho o quebra coco. Não sei se tem bons repentistas que passam horas fazendo seus desafios. Até alguns me disseram que hoje isto não existe mais, os tempos são outros. Novas músicas. Novas canções e quem se anima a cantar as antigas? Sei que tem muitos que nunca viram, nunca participaram e só sabem do quebra coco por ouvir falar ou pela canção cantada pelo Trio Irakitan. Era bom demais e como era gostoso desafiar alguém. E meu Deus! E quando se encontrava um bom repentista? Pensar no que ele ia dizer tirar de improviso sua prosa? Não era fácil. Eu mesmo posso dizer que tentei quando cresci manter a chama do Quebra Coco nos Grupos Escoteiros que participei. Acho que não fui feliz. Os jovens não se interessavam mais. Tudo foi mudando, novas ideias novos Fogos de Conselho. Só se pensava em copiar os esquetes vistos na TV e os conjuntos de funk. Quem diria que naquela época teríamos um animador de fogo? Nunca! Animador? Nem pensar. Era tudo natural, improvisado na hora. Todos participantes eram contadores de histórias e claro um pouco de animadores de fogo.

               Para dizer a verdade acho que foi quando fiz um ano de lobo que ouvi pela primeira vez o Quebra Coco. Estávamos acampados na Vertente do Vale do Onça. Lobos acampando? Risos. Claro, era comum. E porque não? Era mais divertido. 1948, ainda com meus sete anos. Lembro-me do Miúdo (era nosso Balu, nunca fiquei sabendo seu nome real) e do Munir Boca Grande (nossa Bagheera) a fazer os almoços e jantas e que manjar! Eles eram bons e todos nós em volta ajudando, buscando água, lenha, cantando e contando “pataquadas”. Bons tempos. Já tinha participado de dois Fogos de Conselho. Não sabia como era o Quebra Coco. Foi o Bagueera Laudelino Pé de Chumbo quem explicou. Tratava-se de um desafio entre escoteiros. A tropa antes do encerramento do Fogo de Conselho fazia o desafio. No começo todos participavam, mas depois de algum tempo ficavam dois ou três. Os demais não eram bons repentistas e se deixavam de responder eram desqualificados.  

              Na tropa era minha diversão favorita nos Fogos de Conselho. Não adiantava ficar treinando e invento versos em casa. O desafio era claro, tinha de responder o perguntado. Lembro-me do Paulo Salviano. Tinha uma facilidade grande em criar versos. Nada dos conhecidos. Isto era para Patas Tenras. Poucos tinham a “audácia” de desafiá-lo. Já começava cantando assim – “Meus amigos, escutem bem, hoje estou um pouco rouco, mas é bom ficar sabendo, sou o campeão do Quebra Coco” e daí em diante não parava mais. Mas tudo mudou, pois um dia quebraram seu orgulho de cantador. Foi humilhado por um menino matuto, magro, olhos miúdos e cozinheiro da Patrulha Coruja. Era de um Grupo Escoteiro em uma pequena cidade do fim do mundo. Fomos acampar em Serra Vermelha com eles que vieram da cidade de Rio Grande e foi um desastre. Todos da tropa deles perguntavam se nós tínhamos bons “cantadores” do Quebra Coco. Apontaram-no e ele ficava todo orgulhoso. Não falaram nada do Mandinho para ele. Um Escoteiro magrelo, desengonçado e achei até que ele era gago. Quando chegou a hora e ele em pé aceitou o desafio do Paulo, sorri de leve. “Este estava no papo”.

               Deus do céu! Onze horas, meia noite e o danado lá aceitando todos os versos do Paulo e devolvendo em dobro! O Chefe disse que quem quisesse podia ir para as barracas, mas ninguém arredou o pé. Ficamos ali eletrizados com os dois repentistas. Minha cabeça fervilhava, torcendo pelo Paulo dar uma sova naquele magrelo. Mais de quatro horas e o danado do Mandinho ali com um sorriso simples, sem afetação dando uma lição no Paulo e o colocando no chinelo! – Vi que chegou uma hora que ele entregou os pontos. Foi lá do outro lado da fogueira cumprimentá-lo. Parabéns Mandinho ele disse. Perdi mas estou orgulhoso de você! Ele quase desistiu de ser um cantador de quebra coco. Ainda bem que sempre teve em mente que ganhar é bom, mas saber perder é uma arte. Isto sempre nosso Chefe Jessé dizia.

               Os tempos foram mudando. Eu participei de muitos Fogos de Conselho. O Quebra Coco se tornou saudades de um tempo que já se foi. Outras canções trazidas pelos novos chefes, e ele, o meu amado Quebra Coco ficou na história de um livro que não foi escrito. Nunca mais vi o Paulo. Quebra Coco, Quebra Coco, na ladeira do Piá, Escoteiro Quebra Coco e depois vai trabalhar! Até hoje eu me lembro dele e canto com boas lembranças. Sei que a origem é nordestina. Deve ter começado com os repentes esses maravilhosos cantadores que encantam até hoje os que apreciam a música nordestina.

             Tem canções antigas que ninguém esquece. Eu hoje penso e faço minhas histórias nas lembranças boas que passei. Costumo sentar na minha cadeira rústica e sempre vejo uma chusma de meninos jogando bola. Uma rua íngreme. Poucos carros. Cada um se diverte como gosta. Cantava baixinho o Quebra Coco. Saudades vem e vão. Aqui vou lembrando como posso dos meus tempos de criança. Quebra Coco, O meu Chapéu tem Três Bicos, A Árvore da Montanha e tantas outras. Onde está meu violão? Acho que as cordas arrebentaram. Preciso comprar novas e ficar na minha varandinha a cantar. Fazer a melodia brotar de novo pelo som do meu violão. Quebra Coco, Quebra Coco, na ladeira do Piá...

Estou agora chegando, mesmo estando um pouco rouco,
Muito cuidado comigo, sou campeão do quebra coco.

“Minha mãe chamava Caca, e meu pai Caco Maria,
Juntando caco com caco, eu sou filho da Cacacaria!

Quem fica no Facebook, não é um doido varrido,
É uma turma das boas, turma de muitos amigos.

Não chorem na minha partida, hora de o Velho sumir.
A hora passou no tempo desculpem, preciso dormir.


Boa noite meus amigos e amigas. Agora vou dormir embalado pelas estrelas no céu e sonhando que a vida voltou novamente no calor de um Fogo de Conselho! Durmam com Deus!

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

O meu inesquecível chapéu Escoteiro.


Conversa ao pé do fogo.
O meu inesquecível chapéu Escoteiro.

                             Quanto tempo? Não sei. Entrei em 1947 e ele já existia. Ops! Enganei-me, o conheci muito antes. Acho que foi em 1945 e estava com cinco anos. Um Grupo Escoteiro passou desfilando em frente a minha casa. Lindos, garbosos caqui e chapelão.  Meu primeiro contato e sabia que era minha primeira paixão. Rodei mundo com ele. Fui a lugares incríveis e ele ali firme. Meu companheiro de jornadas e alegrias. Desfilei garboso por muitos anos com ele em várias cidades do Brasil. Acordei um dia em um longínquo arraial chamado Martelo em um campinho de futebol na minha barraca de duas lonas o sol nascendo, um povaréu em volta. – Quem são eles? Escoteiros gritou um. Escoteiro claro veja o uniforme e o chapéu. Na pequena igrejinha caída, as margens do Rio das Velhas, quase confluência com o Velho Chico (Rio São Francisco) eu estava lá com mais quatro seniores admirando a enorme árvore que nascera dentro dela. Diziam que ali aconteceram belas histórias. Soube de algumas. Um dia vou contar aqui. Aquela do Jagunço Normandia que ficou ali encurralado pela volante e saiu atirando até no vento acho que já contei. Mas dava para ver um desenho feito a mão de um chapéu Escoteiro e um lenço.

                                Ele sempre foi famoso no Brasil inteiro. Criou raízes de norte a sul e de leste a oeste. Demorou mas se tornou um hábito de comportamento e conhecido entre os Escoteiros. Firmou presença em muitos lares e na mente dos brasileiros. São histórias e histórias para contar. Lembro-me de algumas famosas que digitei em meu chip cerebral para não se perder com o vento que leva nossas saudades e não as trás de volta. Eu e meus companheiros descíamos de Jangada o rio Paraopeba lá pelos idos de 1957/8 não lembro bem. Éramos quatro. Vimos uma enorme fazenda e resolvemos parar. Quem sabe iriamos filar um jantar daqueles gostosos? Isto sempre aconteceu nas fazendas onde estivemos. Apoitamos, descemos e fomos cercados por quatro jagunços armados e levados até a varanda da fazenda a espera das ordens do Coronel. Nome dele? Não lembro. Ele saiu nos olhou, deu uma bela risada e nos abraçou. – Cambadas! Eles são Escoteiros! Veja o uniforme e o chapéu! Ficou em posição de sentido e gritou alto: - Sempre Alerta! Um lauto jantar e camas para dormir e graças a quem?

                                    É. Causos e causos para contar. Ele fez história. Todos o conheciam. Em Malacacheta cidade perigosa onde os matadores faziam fila para mandar alguém para o outro mundo, chegamos inocentes sem saber que ali o clima não era amistoso. A cidade era dominada por grandes empresários que exploravam a Mica (a mica tem alta resistência dielétrica e excelente estabilidade química. Muito usada na época para capacitores, placas de circuito eletrônico etc. Servia e serve também como isolante em equipamentos de alta-voltagem). Já era tardezinha. Quem sabe um campinho de futebol para pernoitar? Na pracinha alguns mal encarados começaram a gritar: - Polícia de Captura! Polícia de Captura! Não entendíamos nada. Um bigodudo com enormes barbas vermelhas veio correndo. “Suas bestas” são Escoteiros, não estão vendo o uniforme e o chapéu?

                           Mas confesso que fui muito paquerado e bem recebido por gente grande. Graças a ele conheci a melhor mulher do mundo. Minha esposa Celia. Conheci também Quatro governadores, dois ministros, secretários estaduais aos montes, vários prefeitos e quando na década de sessenta o Senhor Jânio Quadros candidato a Presidente do Brasil fazia um comício em plena praça da minha cidade, me viu de uniforme (voltava da sede) e gritou – Ei Escoteiro! Faço questão que fique ao meu lado aqui no palanque! E agora José? Fazer o que? Risos. Fiquei apaixonado pelo “cara” e depois me decepcionou. Éramos conhecidos mesmo. Éramos não, somos conhecidos até hoje. Se você duvida embrenhe por matas e cidades perdidas no sertão brasileiro ou mesmo em belas capitais e veja o que seu caqui vai mostrar. Olhe! Eles são Escoteiros! Um costume que criou raízes. Não tirávamos o uniforme para nada em atividade escoteira. Sempre foi nosso salvo conduto. Já contei aqui o susto que demos no exército brasileiro as margens do Rio Doce. Soltamos uma enorme abobora rio abaixo, toda recortada como se fosse uma feiticeira dentuça, com velas acesas e muitas folhas verdes para produzir fumaça e quando ela passou pelo acampamento do Tiro de Guerra nunca se viu tanto tiro. A soldadesca gritava de medo que era o capeta, o demônio, o belzebu e o diabo. Fomos vistos. Estávamos de caqui e chapelão. Na semana seguinte O Capitão Martinho em pessoa no Grupo. Formados em linha ele passou a revista. – Então são vocês? Seis merdinhas escoteiros que botaram o exército brasileiro para correr?

                            Causos e causos. O tempo foi passando. Alguns que não viveram este passado começavam a aparecer. Queriam criar um novo uniforme. Uma meia dúzia entre dezenas de milhares sentiam vergonha da Calça Curta. Sempre aqueles afoitos que acham que o moderno substitui o tradicional. Surgiu o cinza azul mescla, depois o traje e não satisfeitos criaram agora e para ficar a tal da vestimenta. Sem criticas. Minha época de aventuras se foi. Este orgulho que ainda tenho dele sei que será por pouco tempo. Juram por tudo que é sagrado que ele vai conviver com a vestimenta. Coitado. É boi de piranha. Serve para ficar ao lado do novo simpático e ser reconhecido como Escoteiros. Bem planejado. Dois anos, três, cinco oito dez anos talvez? Não sei. Não estarei aqui para ver. Mas torço por aqueles que não conheceram a tradição e querem fazer uma nova. Que tudo dê certo. Quase oitenta anos para se fazer um hábito de comportamento. Dizem agradar os tradicionais e o deixarão por muito tempo. Que seja como São Tomé queria ver para crer. Dizem maravilhas do novo. Que ele é lindo e era o que os jovens esperavam para acorrerem ás fileiras escoteiras. Será? Uma vestimenta moderna vai trazer novamente a chama que faltava nos jovens do Brasil? Desculpe. Não dá para acreditar. Se assim o for agora chegaremos fácil aos cem mil. Verdade? É isto que os jovens que não são querem? Desejo sorte. Vender um produto não é difícil. Difícil é provar que o produto é bom. Desejo mesmo do fundo do coração o êxito da mudança. Não foi BP quem colocou em seu livro Escoteiro que devemos olhar além da ponta do nariz? Mas quem sou eu para criticar. Meu tempo passou. Agora só vivo preso em uma gaiola e vez ou outra alço voou com minhas asas de cera.


                              Pouco tempo ainda me resta. Mas com certeza vou aproveitar cada minuto. Farei do meu uniforme tradicional (que muitos discordam) um marketing do passado. Contarei histórias por este Brasil querido. Contarei dos amigos Escoteiros de outrora, de gente nova que ainda preserva as tradições e que aos poucos vão sendo apagadas da memória escoteira. Mas viver só de memórias não leva a lugar algum. Precisamos sentir o chão aos nossos pés. Ficar de olhos e ouvidos abertos e tomar cuidado, pois um movimento sem tradição nunca terá um belo futuro. Que o vento leve minhas lembranças. Eu sei que ele vai voltar, mas o que ele levou ficará perdido no tempo do passado. - "Sem tradição não pode haver virtude, nem dignidade, nem independência, nem amor à glória. Sem tradição, cada um pro­cura o gozo material, os prazeres, o dinheiro, as posições e os cargos, porém jamais procura os caminhos do Dever para com Deus e a Pátria". – Plinio Salgado.

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Adoro ser um saudosista sonhador.


Crônicas de um Velho Escoteiro.
Adoro ser um saudosista sonhador.

                   Poderia ter começado esta minha crônica dizendo: Oh! Que saudades que eu tenho, da aurora da minha vida, da minha infância querida que os anos não trazem mais... É Cassimiro de Abreu, seu poema bate fundo na alma de um Velho Escoteiro. Ainda mais quando me dizem que o passado devia ser morto e enterrado. Não disseram que esquecer é uma necessidade? Que a vida é uma lousa, em que o destino, para escrever um novo caso, precisa apagar um caso já escrito? Não gritem nos meus ouvidos que devemos voltar o rosto sempre na direção do sol, pois só assim as sombras ficarão para trás. Não acredito nisto. Posso viver o presente, mas nunca vou esquecer o meu passado. Dizem que o nosso presente são das coisas boas ou más que fizemos no passado. Não sei. Eu gosto quando me chamam de saudosista. Hoje existe uma nova ou velha moda comportamental que tenta esconder o saudosismo. Dizer que naqueles tempos, foi melhor que hoje é só para quem conseguiu viver uma vida cheio de alegrias e felicidade. Dizem que de novo a um rumor saudosista, crescendo, afirmando como era bom naquele tempo que a amizade valia mais que uma promessa, que a palavra e a honra era respeitada, onde a lealdade nunca poderia ser posta em dúvida.

                Comentam por aí os defensores do saudosismo que desde que nascemos já temos saudades. Começa quando nos afastamos do ninho cálido onde estivemos por nove meses, um lugar seguro e protetor, onde o mundo ali era somente seu. Mesmo crescendo havia a proteção da mãe, dos amigos, de aventuras que fazíamos de tantas coisas que a gente nunca mais esqueceu. São saudades de um tempo que se vivia sorrindo, alegre e solto, sem muitas imposições da sociedade onde a primavera era lembrada quando as flores começavam a florir encantamentos nos quintais, nas estradas, nos campos que floriam sem a gente saber que a primavera chegou. Ruy escreveu um dia que “saudade é a vontade de outra vez”. De pelo menos mais uma vez. De rever alguém, de reviver algo, de recuperar talvez um elo perdido. Ou de até mesmo tentar descobrir se aquele encantamento foi um belo sonho ou se realmente existiu. Sem perceber construímos ao longo da vida um mar de sonhos que nos faz ter saudades por toda a vida. “Que saudades eu tenho, de ainda menino, ver minha mãe cantar para mim: Boi, boi, boi, boi da cara preta, pega o Osvaldinho que tem medo de careta”.

                 Podem me chamar do que quiserem. Eu tento viver o presente, aceitar as novas normas que aceito, mas não gosto, tentar impingir a mim mesmo que isto não é o que acreditava no passado. Sei que tudo que disser meus pensamentos estarão fixos no passado vivendo realidade que hoje não são mais aceitas. Eu gostaria de personificar meu passado e torna-lo real. Eu brigo comigo mesmo para não deixar morrer aqueles lindos e velhos tempos. Quem sabe minha saudade é a minha própria história, nas páginas contadas aos quatro ventos, belas, generosas e cândidas. Muitas vezes feita de uma tristeza suave, que dói e mesmo assim faz reviver. Dizem que é como chorar sorrindo. Ou derramar lágrimas para bebê-las como se fossem gotas de mel. Mas saudades são lembranças guardadas no coração e nunca são esquecidas pela mente. Ela me parece ser algum pétreo, paralisante, como se eu fosse o Senhor do Tempo e pudesse detê-la ou avançá-la. Sei que não posso mantê-la junto de mim sempre. Dizem que os saudosistas tem alma fechada, como se o medo ou a covardia o impedisse de viver a grande aventura de viajará através do tempo.

                     Eu gostaria mesmo de tonar vivo o meu passado. Apertar um botão e ser arremessado aqueles tempos que amei e nunca mais esqueci. Ah! Se eu pudesse começar tudo de novo, fazer com que o acontecido se torne vivo no presente. Não me culpo e nem sinto culpa por ser um saudosista. Minha condição humana fez de mim um saudoso das eras passadas e esta saudade imensa é que me ajudar a enxergar a beleza do agora e a ter esperança no amanhã. As vezes choro sorrindo, as vezes me levanto e ando para saber se não encontrei a porta do passado, quem sabe a beleza de antes ressurge novamente agora. Foi bom enquanto durou e poderia ser bom novamente se todos pensassem como eu. Mas sei que isto é impossível. Cecílio de quem tirei muitas destas palavras foi sábio quando disse: - O saudosista quer viver do passado. O saudado faz do passado fonte de vida!  

Chefe Osvaldo, apenas... Um Escoteiro!  

domingo, 8 de fevereiro de 2015

A lobinha Dorothy e a Cigarra Azul do Lago Dourado. Lá, muito além do arco-íris.


Lendas Escoteiras.
A lobinha Dorothy e a Cigarra Azul do Lago Dourado. Lá, muito além do arco-íris.

                       Era apenas uma cigarra azul. Nunca ninguém ligou para ela. No mês que todas cantavam para arrumar um namorado, ela simplesmente se calava. Gostava de ficar no tronco da frondosa figueira próximo de sua morada no Lago Dourado do Arco-íris. Era o mês das flores, das abelhas procurando mel, dos beija-flores coloridos a procura do néctar para sobreviver. Suas amigas estavam espalhadas pelo bosque, cantando, pois este era o destino de todas. Era como se fosse na Jângal, na época da Embriagues da Primavera, onde todos ficavam contentes, corriam pelos campos sorriam e cantavam. Isto não acontecia com a Cigarra Azul. Não ela. Nunca foi feliz. Não sabia por que todas as cigarras eram cinza esverdeadas e ela azul. Não podia entender. Na brisa fresca da manhã, ouviu uma vozinha doce e suave a lhe dizer – Canta minha linda cigarra. Porque você não canta? A cigarra Azul olhou espantada. Viu uma menina vestida de azul, com um lenço verde e amarelo e um bonezinho azul sorrindo para ela. – Quem é você? Perguntou a Cigarra Azul – Eu? Eu sou a Dorothy, da matilha azul como você. Sou uma lobinha minha amiga Cigarra Azul. Ela ficou a pensar como podia conversar com aquela menininha tão magrinha, com uns olhos fundos e tristes, que mal conseguia ficar de pé.

                    - Eu não posso cantar! Respondeu. Porque não pode? – Porque sou azul e todas são cinza esverdeada. Sou diferente. Nunca terei uma família. Nunca serei ninguém! Dorothy pediu de novo, desta vez quase chorando: Cigarra Azul cante para mim. Prometo que cantarei com você. Irei aprender a letra e a melodia e ambas cantaremos juntas. A cigarra ficou pensando porque aquela menina insistia tanto para ela cantar. Dorothy então disse a ela – Sabe Cigarra Azul, eu também estou muito triste. Eu tenho uma doença que me acompanha desde que nasci. Meus pulmões sempre me dão falta de ar, tenho dificuldades para respirar e sinto um aperto no peito e tenho tosse. Sou lobinha, mas sou uma lobinha triste. Quero brincar e correr como todo mundo, mas a minha Aquelá não deixa. Diz que não posso ficar no sol, à noite não posso ver o céu, e nem ver o amanhecer do dia, pois não posso também pegar o orvalho que cai. Veja! Ando sempre com esta bombinha. Ela me dá certo alívio.

                     A Cigarra Azul ficou triste mais ainda. Viu que a menina dos olhos cinzentos era mais triste que ela. Resolveu cantar e sorriu para a Dorothy. - Você sabe cantar música Muito alem do arco-íris? Não sei, respondeu Dorothy. Mas cante que vou aprender. A Cigarra Azul tinha uma linda voz. Encantou logo a menina Dorothy. Assim ela começou:

 - ¶Além do arco-íris, pode ser que alguém, veja em meus olhos, o que eu não posso ver. - Além do arco-iris, só eu sei que o amor poderá me dar tudo que eu sonhei...¶

                   Nesta hora Cigarra Azul parou de cantar. Sentiu que uma pedra atingira suas asinhas. Caiu no chão desmaiada. Dorothy não podia acreditar. Olhou e viu Pedrinho um lobinho com várias pedras na mão. Chorou e gritou com ele – Você matou a Cigarra Azul! Pedrinho ria. A Aquelá veio correndo e viu o que aconteceu. Durante toda o Acantonamento Dorothy chorou. Não se conformava. No dia seguinte após o cerimonial de bandeira, Dorothy deu mais ultima olhada para o tronco da figueira. Sabia que não ia ver nada, não custava olhar. Pedrinho a procurou chorando. Pedindo desculpas, pedindo perdão. Dorothy não sabia o que dizer. Afinal ele matou a Cigarra Azul! E então, surgindo no final do bosque eis que surge ela, a linda Cigarra azul, acompanhada de outra cigarra verde garrafa.

                  A lobinha Dorothy não cabia em si de contente. Ria, e até começou a cantar. A Cigarra Azul sorria. – Dorothy, a cigarra dizia – Este é meu namorado. Ele me socorreu. Levou-me até onde esta o Arco-íris. O homem que mora lá, um velhinho de asas azuis me colocou as asas de volta. Agora estou feliz. A Aquelá chamou todos para embarcar. Dorothy não queria ir. Vá – disse a Cigarra Azul. Volte no ano que vem. Estarei aqui para cantamos e sorrirmos muito. Quando chegou a sua casa, contou tudo para sua mãe e seu pai. Eles sorriram. Viram que ela tinha mudado. Já não usava a “bombinha”. Achavam que Deus lhe deram um presente. A saúde de Dorothy.

                   A noite de domingo seu pai disse que tinha alugado um filme para ela. Um lindo filme que ele tinha assistido quando criança. O Mágico de Óz. Era o filme mais lindo que ela tinha assistido. A menina também se chamava Dorothy e a musica era igualzinha a que a Cigarra Azul cantou para ela:

¶- Um dia a estrela vai brilhar, e o sonho vai virar realidade.
- E leve o tempo que levar, eu sei que eu encontrarei a felicidade,
- Além do arco-íris, um lugar que eu guardo em segredo e,
Que só eu sei chegar...
- Me fez ver que o amor dos meus sonhos tinha de ser você...¶

                   Todos os anos Dorothy ia sempre acantonar com sua Alcatéia no Lago Dourado. Lá ela encontrava a Cigarra Azul, seu namorado e agora eles tinham quatro filhos, duas lindas Cigarras verde garrafa e duas outras lindas cigarras azuis! Ei! Deixe-me contar. Pedrinho chorou tanto que se arrependeu. Transformou-se no mais disciplinado lobinho da Alcatéia. E assim termina a lenda e quem sabe a real história de Dorothy e a Cigarra Azul que morava lá, no Lago Dourado muito além do Arco-íris. 

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Açu Pintassilgo, o Jacaré chorão do Lago Ness. (um conto para lobinhos)


Lendas escoteiras
Açu Pintassilgo, o Jacaré chorão do Lago Ness.
(um conto para lobinhos)

       Ele não era um jacaré comum. Nunca foi. Não se enturmava. Morava na beira do Lago Ness. Não saia dali para nada a não ser um mergulho ou outro. Achou próximo aos coqueiros uma enorme pedra. Seu local preferido. Metade da pedra afundava na água escura e ele ali ficava o dia inteiro.  Metade fora d’água e a outra dentro d’água. Seus pais disseram que ele era um legítimo Jacaré-Açu, uma linhagem de muitos e muitos anos. Açu Pintasslgo nunca se importou com isto. Um dia um Escoteiro sentou ao seu lado e conversa vai conversa vem ele disse – Açu Pintassilgo, você sabe o que significa Jacaré para os homens? Dizem que seu nome deriva dos tupi-guaranis, Iakaré ou Yacaré, aquele do olho torto, encurvado e que vê pelos lados. Açu Pintassilgo não achou graça. Olhou para o Escoteiro e disse: E daí? Eu tenho orgulho da minha linhagem. Tanto orgulho que aprendi a ser amigo de todos. Você me conhece bem, sempre fui um cavalheiro com todos os Escoteiros e escoteiras.

        O Escoteiro não disse mais nada. Poderia ter dito que ele era o maior chorão do Lago Ness. Poderia ter dito que ele era motivo de piada para todos na patrulha. Poderia ter dito que nos fogos de conselhos era falar nele e todos morriam de rir. Mas o Escoteiro era leal. Não ia desfazer do Açu Pintassilgo. Isto não. Só que nenhum Escoteiro sabia que lágrimas de jacarés são falsas. Conta uma lenda que seus bisavós os crocodilos quando iam comer uma presa, eles engoliam sem mastigar. Assis para abrir a mandíbula ele precisava comprimir a glândula lacrimal e elas abertas começavam a lacrimejar. As lagrimas lubrificam o olho. Mas Açu Pintassilgo gostava de ver os outros dizer que ele era um Jacaré Chorão.

        Não tenho certeza, mas acredito que foi no verão passado que apareceu nadando uma linda Jacaré. Açu Pintassilgo apaixonou só de olhar. Amor à primeira vista. Naná Verdes Mares olhou Açu Pintassilgo e nem prestou atenção. Foi nadando e ao passar por ele deu um sorrisinho maroto. Açu Pintassilgo pulou na água e quando a procurou viu que ela sumiu. Agora Açu chorava mesmo. Perdeu seu amor e não sabia como fazer. O Escoteiro a tarde apareceu e ouviu sua história. Deixe comigo Açu, você sabe, vou espalhar aos quatros ventos do Lago Ness. Vamos encontrar sua amada custe e o que custar. Dizem que quem tem boca vai a Roma. Sei não. Meu fogão tem quatro bocas e nunca saiu da cozinha. Risos. Durante cinco dias os Escoteiros rodaram céus e terra atrás da amada de Açu Pintassilgo. Até duas patrulhas de Escoteiros do Mar vieram ajudar com seus botes.

          Foi uma luta, mas como os Escoteiros não desistem fácil eles encontraram Nana Verdes Mares tomando sol na Praia do Paco-Paco. Orelhudo era um Escoteiro calmo. Sabia conversar e nunca perdia a “fleuma”. Chegou devagar onde estava Nana Verdes Mares. Ela com seu olhar sonhador fixou Orelhudo e pensou – Que diabos este Escoteiro quer de mim? – Orelhudo não se fez de rogado. Contou tudo devagar, elogiando Açu Pintassilgo, dizendo que era um ótimo partido e ela seria feliz com ele para sempre. Nana Verdes Mares riu. – Olhe Orelhudo, eu já tenho namorado. Ele passa luas e luas sem me procurar e assim fica difícil para começar tudo de novo com outro. Você sabe que as femeas jacarés são as mais fieis que existem entre os repteis. Se vocês acham que podem ajudar procurem Dente Grande o meu amado e digam para ele o que pretendem. – Orelhudo pensou e pensou. Agora a barra pesou. Se o cara-jacaré tem dente grande o melhor é saltar de banda.

           Orelhudo contou para a tropa o que aconteceu. Infelizmente Açu Pintassilgo ficaria solteiro por muito tempo. Neneco Risadinha deu uma opinião. Somos vinte e oito e o tal de Dente Grande é só um. Quem sabe poderemos chamá-lo e fazer um acordo? Assim era Neneco Risadinha e logo contou mais uma de suas piadas – Amigos! Porque o Jacaré tirou o jacarezinho da escola? E rindo respondeu – Porque ele “réptil” de ano. E riu a valer. A tropa de Escoteiros percorreu todos os cantos do Lago Ness e deixou um aviso para Dente Grande. – Cinco Jacarés vindo do Japão estavam à procura dele. Souberam que ele era valentão e precisavam de um Jacaré durão para uma luta de Sumô de vida ou morte. Quando Dente Grande soube disto atravessou dois continentes até o Japão. Lutar era com ele. Mas um navio pesqueiro japonês o viu e o confundiu com uma orca negra. Dito e feito. Dente Grande foi pescado e dizem que hoje é o prato mais delicioso nos restaurantes japoneses. Eles acharam o Sushi de jacaré o melhor do mundo.

            Agora Nana Verdes Mares estava livre. Açu Pintassilgo deitou a correr sobre as águas do lago Ness até onde ela estava. Fez à corte, ela aceitou. Casaram-se e no dia do casamento Toda a Tropa Escoteira presente. Milhares e milhares de peixes, jacarés, crocodilos e centenas de passados enormes. Palmas, foguetes e a festa durou uma semana. Até o Monstro do Lago Ness esteve presente. Bonachão ria a valer das piadas de Neneco Risadinha. A que ele mais gostou foi a do peixe que estava nadando no mar e de repente veio uma onda tão forte que ele morreu afogado! E o monstro do Lago Ness riu a valer e riu mais quando Risadinha contou que conheceu uma loira e ela estava brava, muito brava com um peixe. De repente ela berrou para o peixe – Seu peixe desgraçado! Você vai ver! Vou afogar você!


            Bem apenas uma lenda e não dizem que lenda é lenda? Mas me contaram que enquanto durou o casamento de Açu Pintassilgo com Nana Verdes Mares, o lago Ness ficou infestado de jacarezinhos. E por muitos e muitos anos os dois viveram felizes para sempre!