Lendas
escoteiras.
As aventuras
do Escoteiro Chico Landi.
Aquele que
superou os seus limites.
Faz tempo que eu conhecia Chico Landi.
Confesso que não tivemos um contato muito próximo, pois eu com meus dezesseis
anos e ele com doze havia uma distância muito grande para sermos íntimos. Mas
depois que tudo aconteceu seus feitos e histórias foram de conhecimentos de
todos. Ele mesmo quando entrou para o restrito Primeiro Grupo de Giwell um dia
em um acampamento chamado de Gilwell Park, pois nosso Distrito fazia realizar uma
vez por ano com os chefes Insígnias, tive a oportunidade de ouvir dele toda a
história que era contada no grupo e que virou mito e lenda o que não era
verdade. Ela a história em parte existiu. Disse-me que seu pai era um fã
incondicional de Chico Landi, um famoso automobilista brasileiro além de vencer
varias provas internacionais e o primeiro brasileiro a participar da Formula um.
Este era o motivo de seu nome. Seu apelido de Centelha na Tropa nunca pegou.
Chico Landi era daqueles que sempre dizia –
Escoteiro não corre, voa! Escoteiro que é Escoteiro não chora da risada! A
chuva para o Escoteiro é como pétalas de rosas a cair em seu rosto! Não existe
para o Escoteiro a palavra impossível. Sei que ele tinha um caderno onde
colecionava estas frases e ele mesmo inventava na hora outras tantas. A Baguira
Vera e o Balu Nonato não sabiam como a Akelá Rosinha tinha tanta paciência com
Chico Landi. Bem, era um ótimo lobo, mas não parava de reclamar – Kelá! Tem
dois meses que fomos ao acantonamento, vamos fazer outro! Kelá chega de reunião
na sede. Vamos passear no campo! Chico Landi adorava a natureza. Quando passou
para os Escoteiros tudo mudou. Era uma Tropa quase autônoma de chefia. Marcio o
Chefe tinha pouco tempo para dedicar e sempre reunia os monitores e subs em sua
casa. Trocavam ideias, muitas vezes acamparam juntos e a Tropa seguia sozinha
sem adultos. Monty o Guia dizia sempre – Onde tem um Escoteiro tem uma Tropa e
onde tem uma Tropa tem aventuras.
A vida de Chico Landi se transformou a ponto
de Dona Laurinda mandar chamar seus pais para uma conversa. – Chico Landi
deixou de estudar, Chico Landi só vive nas nuvens, Chico Landi não pode
continuar assim, só fala em escotismo, escotismo e mais nada! Doutor Juvenal
pai de Chico Landi era um pai compreensivo. Conversou longo tempo com o filho. Chico
Landi adorava o pai. Seguia seus conselhos a risca. Mas Chico amava o campo.
Adorava correr pelas campinas, espantar as borboletas coloridas misturando com
as flores silvestres os raios de sol de um amanhecer maravilhoso. Ele cantava e
como cantava. Sabia fazer qualquer tipo de nós. Reconhecia na natureza qualquer
gorjeio, qualquer canto – Olhe! Ouçam! É o pássaro Preto do serrado perdido
aqui nas campinas! Pegadas? Chico era um bam, bam. Nos acampamentos sua
Patrulha Lobo era a primeira em dar o grito para o almoço, jantar, prontos para
inspeção, formaturas e apesar de não ser o Monitor era um motivador sem igual.
- Monty, por quê? Monty ria, ora, ora Chico
Land, não podemos viver em um acampamento. A sede precisa de nós. Humm! Ele dizia
se é assim então vamos fazer um Salcedo? Para quem não sabe Salcedo era um apelido
que deram ao Comando Crow. Eles faziam diferente, um de cada lado, ao se
encontrarem tinham de passar um pelo outro. Sempre um despencava no chão. A
vida era bela para Chico Landi. Uma família que o amava, um grupo Escoteiro
respeitado pela comunidade, uma Tropa de aventuras e uma Patrulha sem igual.
Bem vamos dar os méritos a Dona Laurinda a professora e o Padre Gabriel. Eles
também sem perceber faziam parte da família feliz de Chico Landi. A vida tem
destas coisas, quanto menos se espera o destino bate na porta. Não tem jeito.
Bateu levou. Desta vez foi uma pancada forte do destino na vida de Chico Landi.
Seis bandidos resolveram assaltar o Banco do
Brasil. Único na cidade. Prenderam os quatro praças e o sargento Nonô na
cadeia. Acharam que a cidade estava dominada. No banco Zé Pinta Cega um
vaqueiro da fazenda Luvião não achou graça naquilo. Mandaram todo mundo deitar
no chão e um dos bandidos dava chute nas costas e na cara dos clientes. Zé
Pinga Cega não levava desaforos para casa. Seu 38 querido estava lá onde sempre
esteve. Dentro do bolso comprido de seu paletó feito exclusivamente para
carregar seu amigo de tanto tempo. Nenhum dos bandidos reparou nele. Pudera um
anão não mais que um metro e cinquenta magro e um bigodinho a lá Charles Chaplin.
Com três tiros Zé Pinga Cega matou três, mais um tiro e um caiu estrebuchando
no chão, dois correram e Zé Pinga Cega correu atrás. Eles abriram fogo e o Zé
Pinga Cega recebeu um balaço nos quadris, mesmo caído ainda atirou. Não acertou
ninguém e desmaiou. Os bandidos fugiram sem levar nada.
Levaram Zé Pinga Fogo para o Hospital de
Eldorado a vinte quilômetros dali. O povo alegre dançava na praça festejando o
acontecido. Ninguem notou que atrás de um pé de Jabuticaba centenária Chico
Landi gemia e cantava. Um canto triste. Ele cantava o Rataplã. Ninguem ouviu a
principio. Dona Modesta foi quem viu. Deu um grito de susto. Chico Landi
sangrava e muito. Seu rosto branco como cera. Mais um para o hospital de
Eldorado. Ele tentou imitar o seu herói. Aquele que disse que um Escoteiro
caminha com suas próprias pernas. Não deu nem um passo. Ainda estava vivo.
Alguém o viu correr para a pracinha quando o tiroteio começou. Uma bala
perdida. Chico Landi ficou entre a vida e a morte vinte dias. A escoteirada, a
lobada e os chefes todos os dias pegavam o caminhão do seu Rangel e iam para
Eldorado visitar Chico Landi. Dona Neném sua mãe dia e noite ao seu lado. Seu
Pai o Doutor Juvenal fez tudo que podia. Chico não iria morrer, mas estava
tetraplégico. Nunca mais iria andar. A noticia caiu como uma bomba na cidade. A
lobada e a escoteirada chorava em todos os cantos. O Padre Gabriel convidou
toda a cidade para uma grande missa e pedir a Deus por Chico Landi. Era o
menino mais alegre da cidade. Vivaz, grande Escoteiro, amante da natureza, era
uma infelicidade ele ficar assim.
A praça tomada, quase toda a cidade estava
lá. Muitos Escoteiros eram coroinhas e estavam no altar a espera do início da
missa. A maioria dos presentes tinham os olhos cheios de lagrimas, A Akelá
Rosinha, a Baguira Vera e o Balu Nonato choravam como bebês. Monty o Guia da
Tropa estava firme com seu bastão em pé ao lado do altar. Não chorava, mas seu
coração estava sangrando. Ninguem podia acreditar no que estava acontecendo. O
carro do Doutor Juvenal e dona Neném estava chegando à praça. Traziam Chico
Landi em uma cadeira de rodas meio caído do lado. Todos olharam para ele com
uma pena enorme. Os soluços aumentaram. Alguém gritou – Uma palma para Chico
landi! A praça ribombou de cima em baixo. Chico olhava aquilo sem acreditar.
Ele não podia estar tetraplégico. Não podia. Deus não ia dar a ele este
caminho.
Um grito enorme na multidão. Um silêncio
sepulcral. Chico Landi se esforça e fica em pé. Impossível diziam os médicos
que o assistiram. Chico sorria. Cambaleando foi até o altar. O padre Gabriel
ajoelhou e gritou – Um milagre! Um milagre! Louvado seja Deus! Um coro de
palmas durou bem uns vinte minutos. Sorrisos em profusão. Os seis patrulheiros
da Lobo o carregaram dando uma volta pela praça. Chico Landi ria e chamava em
alto e bom som – “Monty, Monty”! Eu quero acampar! Eu quero voltar ao campo
nesta primavera, eu quero ver as flores no monte Sariel, eu quero beber a água
da fonte do roncador. Monty, Oh! Monty. Papai e mamãe estão sorrindo eles não
vão dizer não!
Eu e Jota Maro um Chefe novato, mas já Insígnia
escutávamos aquela história absurda, mas tão bem contada que a gente chorava.
Um choro simples de alegria, de saber que o final foi feliz. Chico landi
levantou do banquinho de madeira que ele mesmo tinha feito. Eu juro por Deus
que é verdade. Eu juro por tudo neste mundo. Chico landi ficou em pé, atrás
dele um enorme raio de sol, seria o sol da meia noite. O fogo que estava quase
acabando se alastrou. As fagulhas da noite iluminaram aquela clareira onde estávamos.
Uma brisa gostosa vindo do norte nos pegou de pronto. Olhei para Jota Maro, ele
sorria. Olhamos de novo para Chico Landi, ele olhava para o céu. Uma grande
estrela brilhante estava lá. A maior estrela que eu já vira até então. Parecia
que ela e ele eram um só.
Paro por aqui. Para muitos seria uma história
impossível. Para mim a verdadeira história de um Escoteiro que acreditou. Ele
era o protetor da natureza. Viveu sua vida em função dela. Como dizia meu amigo
Chico Xavier - Em minhas
preces de todo dia, sempre peço coragem e paciência. Coragem para continuar
superando as dificuldades do caminho naqueles que não me compreendem. E
paciência, para não me entregar ao desânimo diante das minhas fraquezas!... “E
guardemos a certeza pelas próprias dificuldades já superadas que não há mal que
dure para sempre.”.
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