Crônicas de um Chefe Escoteiro.
Quando termina a motivação Escoteira.
O escotismo como qualquer associação onde voluntários se interagem, é
comum haver falta de sintonia levando muitas vezes o voluntário pedir demissão
e na maioria dos casos nunca mais voltar. Aqui mesmo e nos meus e-mails recebo
relatos de chefes que passam por isto. É difícil aconselhar. Cada caso é um
caso. Quem não passou por esta fase? Tem hora que você desanima. Dá vontade de
largar tudo e sair por ai. Outros ainda insistem, mas sabem que o caminho que
estão seguindo não leva ao sucesso. Se procurarmos um serviço de autoajuda
teremos vários. As belas frases de efeito pululam por todos os lados. Nem
sempre palavras somente ajudam. Aquela motivação quando entramos agora não é
mais a mesma. O escotismo é interessante. No início tudo são flores, sorrisos,
promessas, alguns até deixam as amizades que tinham em troca de novas que
conquistaram. Nos primeiros meses, e até nos primeiros anos aqueles mais
chegados se espantam com tanto carisma, com tanta demonstração de alegria que
ele acredita ter alcançado um novo patamar de uma nova vida. Eles dizem que
agora tem uma nova filosofia de vida. Seria assim mesmo?
Muitos grupos tem estrutura arcaica e na sua maioria dirigida por um
líder que ficam anos e anos no poder. Se ele este líder não sabe liderar e se
for daqueles que pensa se insubstituível ou mesmo acreditando ser melhor, então
é difícil extirpar o mal, se é que existe algum mal. Na maioria dos grupos bem
estruturados existe uma democracia consistente onde um Conselho de Chefes
realizado mensalmente, aparam arestas e isto traz a paz e a continuidade. Mas
quando o líder se acha dono da verdade então é muito difícil. Dizem os poetas
que o que mais sofremos no mundo não é a dificuldade, é o desânimo em
superá-la. Não é a provação, é o desespero diante do sofrimento. Não seria o
fracasso e sim a teimosia de não reconhecer os próprios erros. Eu já
passei por isto. Inúmeras vezes. Os problemas são diversos e não é fácil
superar. Não temos só o escotismo como meio de vida, temos nossa família, nossa
atividade profissional e até amigos fora
do escotismo. Então aparece a falta de ética, de amor, de sinceridade,
transparência e lealdade dos que se dizem irmãos de todos. Nesta hora sentimos
que a falta de entendimento nos dá vontade e que vontade meu Deus de encontrar
um buraco e se enfiar nele. Claro tem os mais fortes. Eles não transmitem para
ninguém seus desânimos. São fortes. Enfrentam aqueles que se julgam donos da
verdade. Mas até quando?
Se notarmos bem a matemática Escoteira é simples. Trinta e poucas reuniões por
ano. Somando as reuniões de sede, acampamentos e excursões quem sabe podemos
chegar ao máximo há quinhentas horas anual. Pensemos que na maioria das vezes
temos nove meses de atividade, pois muitos têm férias em julho, dezembro e
janeiro. Se eu estiver certo dedicamos cerca de vinte dias por ano ao
escotismo. Claro que tem aqueles mais abnegados com o dobro de horas doadas ao
Movimento Escoteiro. Para uns uma eternidade para outros muito pouco. Mas
porque então o desanimo? Penso que existem vários motivos, mas para mim o
principal deles é a decepção com o ser humano. Quando começamos pensamos que o
escotismo é um mar de rosas, que a Lei e a Promessa são levadas a sério por
todos que participam dele. Muitos se dizem líder, mas isto nem sempre acontece.
Liderar é saber ser liderado e isto não é tão fácil. O pior são aqueles
déspotas, que com o tempo a gente se sente ameaçado por uma força opressora e
que pensávamos ser amigo e irmãos dos demais.
Faz-nos muita falta um aperto de mão carinhoso e sincero. De um abraço fraterno,
de um sorriso gostoso de uma palavra de carinho principalmente daqueles que
convivemos em ambiente que achamos ser a nossa segunda família no grupo
Escoteiro. Tem aqueles que nos olham como se fossemos parte do todo,
indispensáveis em todos os sentidos, mas nem sempre é assim com a maioria. Uns
poucos nos veem como indesejáveis, subservientes, dispensáveis, e se pudesse
diriam: - Vocês estão aqui para servir e mais nada! E então vem aquele desanimo
aquela vontade de sumir de mandar todo mundo às favas. Nem sempre fazemos isto.
O nó na garganta demora a desaparecer. A promessa que fizemos nos atou nos
sonhos escoteiros. Insistimos e alguns dão a volta por cima, mas outros não
conseguem. Um dia ele vai embora. Afinal ele pensou que o escotismo seria uma
fraternidade e não foi. Quem sabe está aí um dos motivos da grande perda que
temos de adultos que estão nos ajudando como voluntários, mas foram
desconhecidos como tal.
Dizem que nosso movimento é obediente e disciplinado. As diretrizes nos
são impostas pela associação de maneira quase sempre ditatorial. Nunca somos
consultados e sempre exigidos. A liderança se acha dona da verdade seja ela nos
mais altos escalões ou até mesmo na unidade Escoteira. Muitas vezes somos
ameaçados, somos exigidos e nada vem em troca. A associação peca por não
valorizar o voluntário. Ela sabe que é um trabalho enorme participar e acredita
que está lidando com funcionários pagos, esquecendo mesmo a boa cidadania e as
boas relações humanas que deviam existir entre um e outro. Somos voluntários
para tudo. Para organizar uma sessão, um grupo, correr atrás para suprir
necessidades e no final das contas gastamos do próprio bolso para nos mantermos
na ativa. Isto tem reconhecimento? Que eu saiba não. Dizem que a culpa é nossa
por não sabemos agir, não aprendemos a verdadeira técnica de direção. Os cursos
nem sempre dão o que se espera. Claro alguns deles são bons outros não. Taxa
elevada e para o voluntário com família a sustentar é difícil. Dizer que o
grupo paga é uma utopia sem tamanho para um grande número de grupos escoteiros.
Seria tão bom se fossemos
realmente o que preconiza o escotismo. Uma fraternidade sem igual onde o
sorriso encanta a todos. Onde se acredita em um aperto de mão sincero, onde o
abraço é um amigo acolhedor, onde alguém diz que somos importantes para o grupo
e agradece nosso trabalho. Quem sabe o conforto sem burocracia de um
agradecimento maior sem necessariamente ser uma condecoração? Quem sabe receber
da região ou da UEB uma cartinha no dia do nosso aniversário? Uma vez por ano
os nossos lideres nos desejarem feliz natal e prospero ano novo? Quem sabe no
final dizer que somos importantes e que conta conosco? Será que não nos falta
cursos de relações humanas? Afinal temos ou não uma estrutura fraterna onde o
respeito e o amor acontecem?
Eu costumo dizer que devemos
lutar pelo que acreditamos. Mas nem todos tem a mesma maneira de pensar. A
estrada Escoteira é cheio de pedras e espinhos o que não deveria ser. Sem
alguém para nos dar apoio é difícil prosseguir. Acreditar que vivemos entre
irmãos Escoteiros. Muitas vezes estamos nos enganando. Seria bom pensar que a
amizade e fraternidade existem que vivemos em uma associação onde os superiores
são irmãos de ideal. Que o sorriso fizesse parte sem um desdém que muitos
preferem. Sei que não há solução mágica. Mas sem o primeiro passo da Direção
Nacional valorizando os voluntários, nunca iremos chegar lá. Este nó górdio que
nos atrapalha, que nos faz desistir tem de ser desmanchado. Sei que a maioria
não precisa disto. Estão em bons grupos e ali se sentem realizados. Isto é bom,
mas existe um grande numero que não é assim. Quem sabe um dia vamos mudar que
tudo será um lindo Arco Iris colorido. Enquanto isto não acontece, vamos
vivendo e deixando viver. Queira ou não o escotismo ainda é um amor que nunca
morrerá em nosso coração.