Conversa
ao pé do fogo.
O
Chifre de Kudu.
O Kudu (Tregelaphus strepsiceros) é uma espécie de antílope cujo habitat
vai desde a África do Sul á Etiópia. Um touro Kudu pode chegar a uma altura de
1,5 metros e tem uma coloração que vai de um cinzento avermelhado até quase
azul. As suas características de visão aguçada, bom sentido de audição, olfato
apurado e grande velocidade fazem dele um animal difícil de capturar. Seguindo
uma tradição que remonta há 90 anos, as patrulhas são chamadas a reunir com o
toque tradicional do chifre de Kudu, durante os cursos da Insígnia de Madeira. Pode
parecer estranho que o chifre de um antílope africano, do tipo usado pelos
Matabeles como clarim de guerra no século XIX, seja usado para chamar
Escuteiros e Chefes por esse mundo fora. Mas foi precisamente com um toque
deste chifre que os primeiros Escoteiros foram acordados.
Quando reuniu os
primeiros escoteiros em Brownsea, Baden-Powell lembrou-se do chifre de Kudu que
tinha trazido das guerras contra os Matabeles, e usou-o para dar um toque
de aventura e divertimento ao acampamento. De facto, foi durante o acampamento
experimental de Brownsea, em Poole Harbour, no verão de 1907, que Baden-Powell
colocou ao serviço do Escotismo, e pela primeira vez, o chifre de Kudu. William
Hillcourt, um dos grandes pioneiros do Escotismo, o mesmo que escreveu o resumo
da história de BP no final do «Escotismo
para Rapazes», descreve assim a primeira alvorada em Brownsea:
"O dia começou
ás 6h da manhã, quando BP acordou o acampamento com o som esquisito do longo
chifre de Kudu em espiral - o clarim de guerra que tinha trazido da sua
expedição à floresta de Somabula durante a Campanha Matabele de 1896".
John Thurman, grande
nome do Escotismo britânico, conta como BP conheceu o chifre de Kudu:
"Como coronel em África, em 1896,
Baden-Powell comandou uma coluna militar na Campanha Matabele. Foi num raid
pelo rio Shangani abaixo que ele primeiro ouviu o som do chifre de Kudu. Ele
andava confundido pela rapidez com que os alarmes eram espalhados entre os
Matabeles, até que um dia se apercebeu que eles usavam o chifre de Kudu, o
qual tinha uma grande potência sonora. Era usado um código. Assim que o inimigo
era avistado, o alarme era tocado no Kudu, para todos os lados, e assim
transmitido por muitas milhas em pouco tempo."
Depois da ilha de
Brownsea, o chifre de Kudu voltou para a casa de BP onde permaneceu
silenciosamente durante 12 anos, enquanto o movimento que ele anunciara se
tornava moda e se espalhava pelo mundo fora. Então, em 1919, Baden-Powell
entregou o chifre ao Parque de Gilwell para ser usado nos primeiros cursos para
treino de Chefes. William Hillcourt comenta assim o início do uso do chifre de Kudu
no Parque de Gilwell, na floresta de Epping, Inglaterra, a oito de Setembro
de 1919:
"O primeiro acampamento para treino de chefes
feito em Gilwell começou a oito de Setembro. Seguiu o padrão que BP tinha usado
com os rapazes em Brownsea, 12 anos atrás. O sistema de patrulhas foi novamente
posto á prova com 19 participantes divididos em patrulhas e vivendo uma vida em
patrulha. A instrução tomou a mesma forma que em Brownsea. Cada dia um assunto
novo era introduzido e aplicado em demonstrações, prática e jogos. O chifre de Kudu
dos Matabeles que tinha sido usado para chamar os rapazes em Brownsea foi usado
para todos os sinais."
Dez anos mais tarde, aos 72 anos
de idade, Baden-Powell levou consigo o chifre de Kudu para a abertura do 3º
Jamboree Mundial, em Arrowe Park, Birkenhead, Inglaterra, a 28 de Julho de
1929. Foi constatado, pela experiência de Arrowe Park, que fazer soar o chifre
de Kudu é um desafio. Os resultados, no entanto, foram tão impressionantes
quanto se poderia desejar, segundo as palavras de William Hillcourt:
"O dia da abertura do 3º Jamboree Mundial começou com uma forte chuvada
que aumentou com o passar do dia; mas, à hora prevista... o tempo tornou-se
«ameno». BP tinha trazido consigo para Arrowe Park o velho chifre de Kudu dos
dias da guerra com os Matabeles que tinha sido usado para acordar os
acampados em Brownsea no primeiro acampamento de escoteiros do mundo e para
abrir o primeiro curso para chefes no Parque de Gilwell. Levou-o aos lábios
para dar um toque que haveria de ecoar pela extensa parada em frente dele, mas,
com o excitamento, os lábios recusaram-se a fazer o que deviam. O som do chifre
não passou de um fraco «pff». No entanto, como que chamados para a ação pelo
chifre, a marcha começou, com os contingentes a desfilarem atrás de
contingentes em frente da plateia, com as bandeiras de quase todas as nações
civilizadas desfraldadas ao vento, com milhares de pessoas a aplaudirem cada
nação entusiasticamente.”.
Ainda hoje o chifre é usado para
reunir chefes em cursos de formação em todo o mundo. Para todos os que seguem
as pegadas do fundador, é um viver do Escotismo no seu melhor.
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