Conversa ao
pé do fogo.
E agora? O
que eu faço?
O telefone tocou duas, três quatro
vezes. Eu não sou amante de telefone. Ele incomoda. Nas horas mais incríveis
ele toca. Molhado no chuveiro não dá. Daquele jeito no banheiro também não. Dormitando
em minha varanda pensando em uma boa história finjo que não escuto. E ele toca,
ele toca. Prim., prim., prim.! Atendo com má vontade – Senhor Osvaldo? Voz
esnobe, eu não gostei. Vai vender o que? Estou ligando a pedido do Doutor Peter
Von Klaus, não sei sabe, mas ele é o Presidente da Mercedes Bens mundial e tem
a maioria das ações nas maiores empresas do mundo. Ele pediu se o senhor têm um
tempo para conversar com ele. Caramba! Um figurão? Falar comigo? - Você sabe do
que se trata? Pergunto. - Ele prefere que seja pessoal. – Meu amigo, para mim é
difícil ir onde ele está. Meu carrinho está sem gasolina, ando duro e ainda dirigindo
muito mal. – Chefe! (ele disse Chefe?) nossa limusine vai buscar o senhor.
Marque a hora e o lugar! Ops! Andar de limusine nunca eu andei. Deve ser da
hora, como diz meu neto - Certo, olhe moro em Osasco, Rua do Buraco Quente sem
número. Ela é uma travessa da Av. Marginal na Vila dos Sem Nada. Fácil de
achar. Cinco e meia da manhã em ponto. As seis nos encontraremos no seu escritório
– Chefe! Muito cedo. Se ele quer falar comigo que levante cedo! Tirei uma de
gostoso. Afinal um figurão me procurar, enviar limusine e um mordomo para fazer
o convite?
O Doutor era como eu. Pontualidade
britânica. Cinco e meia e na porta de casa lá estava eu de calça curta e
chapelão. A limusine chegou e partimos. O Doutor já estava no escritório na
Paulista. Subimos no seu elevador particular. Uma linda secretaria me
acompanhou ao seu imenso escritório. Que mulher sô! Deve ser sueca. Cara
simpático. Pensei que era um daqueles CEO gorducho e não era. Novo, uns
cinquenta e poucos anos. Saradão. Levantou da poltrona me deu um belo sorriso.
- Bem vindo Chefe! O descobri no Facebook! Gostei do seu estilo e quero que
trabalhe para mim. – Olhei para o moço com olho torto. Trabalhar? Como? Mal
aguento andar. Meu ar não é meu amigo e some sempre, minha tosse é uma velha
companheira. Ele Sorriu! – Calma eu sei o que tem. Sei das suas dificuldades,
mas olhe eu preciso de um Super Gerente Escoteiro. – Puxa! E agora? Eu gerente?
Nunca fui um. Mas não dizem que toda hora é hora? Deixe-me explicar melhor. E
assim ele começou a me dizer da sua esplêndida ideia para fazer dinheiro com o
escotismo. Meus olhos esbugalhados.
Chefe, cá entre nós, sabemos eu e o
senhor que o escotismo do futuro será só para famílias endinheiradas. Quem é
pobre ou fica rico ou vai desaparecer na multidão. Ummmm, eu pensei! Será ele
parente do Caco Antibes? Ele é quem dizia - Detesto pobre! – Mas deixei o
chefão continuar... – Minha ideia Chefe é criar no Morumbi e também nos
Jardins, com ramificações na Granja Julieta e na Avenida Angélica onde os
advogados endinheirados moram, Grupos Escoteiros de elite. O melhor dos
melhores. Tudo coisa de primeira. Uma sede que ninguém nunca viu de tão linda,
vamos gastar, vamos deixar o Edir com seu templo no chinelo. Nossas barracas
serão automáticas, contrataremos vários executivos da Microsoft, com programas
que o tal de SIGUE vai esconder nas cavernas profundas da Paulista. Nossos
Escoteiros terão o melhor uniforme já confeccionado. Mandarei vir estilistas da
Europa. Os jovens que irão participar serão a nata das famílias ricas do
Brasil. Quem quiser participar teremos uma taxa de vinte mil reais mês. Os
acampamentos serão feitos em locais preparados, com todo o conforto. Estou
pensando em cinco anos um milhão de Escoteiros.
Nossos chefes saíram do quadro dos
Professores da USP, serão os melhores pedagogos, psicólogos, cientistas e o
escambal! – Bem, pensei, o cara é megalomaníaco. Deixemo-lo continuar - Chefe
não me subestime. A UEB será comprada facilmente. Se não me venderem boto todos
eles na justiça. Tenho na mão os melhores advogados do Brasil. Iremos fazer um
escotismo a nossa moda. O senhor vai dizer como será. O senhor decide se este
Inglês general ainda será o guru de todos. Teremos um ministério só nosso. O
Presidente sabe quem eu sou. Compraremos vários ônibus último tipo. Para viagens
internacionais estarão à disposição dois Airbus 380 e dois Boeing 780. Nossos
Escoteiros e Escoteiras irão acampar no Nepal, no Deserto de Mojave, nas
cavernas do Afeganistão, no vale da Morte, e quando houver viagem à
lua, mandaremos para lá todos os Lis de Ouro e Escoteiro da Pátria. Deus meu!
Estava impressionado.
- Mas Doutor, o senhor só vai gastar sua
fortuna? Ele riu. Esbugalhou de rir. Sou besta por acaso? Vamos fazer dinheiro,
o escotismo é um manancial. O Senhor
está por fora da mixaria que eles recebem com estas inscrições com preço lá em
baixo. Nem sabe quanto rende um Jamboree e faremos um por ano. As regiões irão trabalhar para
nós. Chefe! Isto é uma mina de dinheiro! Só para saber que não estou brincando
vamos fazer um contrato com o senhor de cinco anos, três milhões de dólares por
ano! Acha que lhe pagaria isto se o escotismo não valesse o quanto pesa? É ouro
puro Chefe! – O caldo estava engrossando. Era dinheiro prá burro. Eu ia virar
um potentado árabe sem perceber. E agora? Ele continuou – Chefe, como o senhor
ficou de olho na minha secretária, ela será sua secretária. Fará tudo que o
Senhor quiser e riu baixinho. – Pensei comigo – O paspalho não conhece a
baixinha. Mas estava gostando da coisa. Um apartamento de cinco quartos
mobiliado de frente para o Parque Ibirapuera, mordomo, quatro empregadas, carro
com motorista, a coisa tava boa demais.
Não sei por que senti um
comichão no cangote. Olhei para ele e vi que ria com os olhos vermelhos. Na
testa crescia dois enormes chifres. Putz! Fui enganado, era o diabo? Ele notou
que estava descobrindo sua verdadeira identidade e voltou ao normal. - E então
Chefe, topas? Topar o que? Tinha de fugir dali o mais rápido possivel. Não deu.
Ele me segurou pelos ombros, me sacudiu e eu quase cuspi o coração para fora –
Aceite sua besta, aceite! Vamos acabar logo com esta escoteirada sem tostão.
Essa UEB que só sabe falar e escrever. Pobre não tá com nada. E dava
gargalhadas e gargalhadas. – Marido! Marido! Acorda! Abri os olhos e vi a
Celia. Graças a Deus que era um sonho. Mas ali na minha varanda onde cochilei
pensava – Que grana, que vida, e cá prá nós, a secretaria sueca era demais.
Kkkkkk.
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